O universo inteiro

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Imagine que, de todos os alimentos e iguarias que existam no mundo, você tenha à disposição o que há de mais delicioso, fantástico e saboroso. Que esse alimento lhe seja servido a hora que você desejar, na medida certa, à temperatura ideal, e que só te faça bem. Assim é o seu leite para o seu bebê. 

Imagine que você possa estar no lugar mais lindo, aconchegante, que lhe envolva os sentidos, lhe encha os olhos e lhe aqueça o coração. Que você só deseje estar ali, e voltar sempre. Que esse lugar te faça esquecer de tudo, te faça relaxar e descansar. Um lugar seguro, onde você se sinta protegido e acolhido. Assim é o seu colo para o seu bebê. 

Você é o mundo dele. Você é tudo o que há de bom e do melhor. Você é a pessoa mais amada, mais desejada, tudo em você exala amor e cuidado. Você é o lar. Você é o abrigo. Você é simplesmente tudo e sem você ele não poderia ao menos sobreviver. Não poderia se alimentar, se desenvolver, aprender sobre o amor. Assim você é para o seu bebê. O suficiente, o bastante, o universo inteiro. 

Refletindo sobre isso pensei que assim Deus é para nós também. De todos os seus nomes, o que melhor expressa esse vínculo é o Pai. Sem ele não poderíamos nem respirar, nem existir, nem ser. É tudo por meio dele. Ele é o pão, a vida, o refúgio. Ele é o próprio amor. 

Deus é o colo sempre presente, o alimento que sacia. É a paz, é o lar, é o sustento. É quem provoca nosso riso e nos preenche de alegria. Que reconfortante poder dormir sabendo que temos um Pai a olhar sempre por nós. 

Uma das coisas mais lindas da maternidade e da paternidade é poder entender de um outro ângulo, mesmo que minimamente, o amor de Deus por nós. 

Irreversível

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Um dia você vai crescer. E esse dia não está longe, eu sei. Quero que você saiba que tantas vezes fiquei te olhando dormir. Decorando cada traço seu, cada pequena expressão.

Que amei te amamentar, te ninar, te encher de beijos. Que me diverti tanto brincando com você na sala. Que li para você. Que orei com você. Que te dei todo o meu colo, toda a minha atenção, todas as minhas forças.

Que brinquei com você a cada banho. Que beijei seus pezinhos nas trocas de fraldas, te apresentei todos os dias à sua própria imagem no espelho, te confortei quando você chorava.

Quero que você saiba que você me transformou por inteiro. Que você nasceu no meu coração, cresceu no meu ventre e trouxe à tona tanta coisa que havia nas profundezas de mim.

Que você me forçou a resgatar meus valores mais primários. Me trouxe de volta ao simples. Me arrancou com força dos trilhos profissionais que tanto me empenhei em trilhar.

Que você invadiu praticamente todos os meus assuntos, impregnou meus textos, apareceu em meus sonhos. Seu cheiro grudou em mim. Irreversível. Você me tornou mãe.

Licença-maternidade

Mulher segurando bebê no colo

São braços que empurram o carrinho pelo mundo afora. São tardes solitárias. São madrugadas que parecem não ter fim. É o eterno balançar para lá e para cá. É olhar para o teto, é olhar para as paredes, é pensar e pensar e pensar.

É segurar o bebê no colo. É ninar o bebê no colo, é comer com o bebê no colo, é andar pela casa com o bebê no colo. É segurar o bebê com um braço enquanto você tenta garantir a sua sobrevivência com o outro. É dor nas costas e dor nos braços.

É não dormir, é dormir pouco, é dormir picado, é querer mais do que tudo simplesmente conseguir deitar e dormir sem que nada nem ninguém te acorde. É deitar sem saber que horas vai acordar e acordar sem saber que horas vai conseguir dormir de novo.

É ficar de camisola de manhã. Às vezes até a tarde. Às vezes até a noite. É fazer pequenos planos para quando o bebê tirar a soneca do dia. É não conseguir fazer nada pois o bebê só quer tirar a soneca do dia se for no seu colo.

É um eterno intercalar de mamá, troca de fraldas e tentativa de fazer dormir. E no interlúdio de tudo isso tentar preparar a comida, comer, tomar banho, arrumar a casa, lavar roupinhas e esterilizar chupetas.

É esquecer que dia da semana é hoje, é esquecer a panela no fogo, é esquecer o restante da frase, é esquecer a blusa aberta na rua.

É chorar escondido no banho. É estar na melhor companhia do mundo e às vezes se sentir assustadoramente só.

É amamentar com o celular na mão, é fazer dele a janelinha por onde você espreita o mundo. E, pasme, ele ainda está lá. É participar de novos grupos de WhatsApp, é ver que muitas passam pelo mesmo que você.

É fazer caras e bocas para tentar arrancar um sorriso, é querer registrar para sempre na memória aquele lindo sorriso desdentado. É conhecer o melhor som do mundo: o som da risada do seu bebê.

É tirar milhares de fotos, encher o celular de vídeos, é ter a ânsia de registrar cada pequena expressão fofa, é não querer esquecer nada. É ver e rever e rever as fotos daquele serzinho.

É a constante contradição de desejar que o tempo passe logo nas fases difíceis e que o tempo passe mais devagar pois seu bebê está crescendo rápido demais.

É questionar valores, é questionar o futuro, é viver tanto em função dos quereres desse novo ser que você mesma já não sabe bem o que quer. É a negação de si mesmo em prol de outro alguém.

É um medo que às vezes bate à porta sem avisar. É a tristeza que não se explica. São as lágrimas fáceis que em um segundo aparecem, rolam e encharcam. É cansaço misturado com gratidão.

Assim como você

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Assim como você, quero sugar cada segundo desse momento. Eu não quero perder um só sorriso seu, mesmo aqueles de canto de boca depois de mamar. Quero sentir seu corpinho recostado no meu peito, entregue, reconhecendo seu ninho.

Quero retribuir seu olhar tão puro e tão atento. Quero ser o melhor lugar do mundo para você, e ver seus olhinhos revirando de satisfação quando encontram o seu alimento no meu peito.

Quero apreciar sua expressão tranquila, de olhinhos fechados, em um sono gostoso que deixa escapar uma risadinha hora ou outra, e me perguntar com o que você estaria sonhando.

Assim como você, às vezes tenho medo. Também choro quando estou cansada, ou quando preciso de colo, ou quando me sinto só, ou até mesmo sem motivo aparente.

Quero te dar a mão, e sentir você segurando meu dedinho com sua mãozinha apertada, recebendo meu apoio. Quero que você saiba que eu sempre estou aqui.

Assim como você, também estou aprendendo, descobrindo novas sensações a cada dia, entrando em sintonia com este novo mundo. É tão maravilhoso quanto assustador, eu sei. É a vida acontecendo. E será sempre assim.

Tudo vapor

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– “Abre um pouco mais a perna. Assim.”

Por que eu tinha que abrir mais a perna? Algo estava estranho. Esperei aquele som acelerado inundar a sala, mas não veio. Será que o som da máquina estava desligado?

Eu tentava decifrar a expressão da médica, que examinava com atenção a tela, certamente pensando em uma forma delicada e profissional de me dar a notícia que eu não esperava ouvir. Após intermináveis segundos, a verdade veio como um soco: “Não tem mais coraçãozinho batendo”. Não tem mais coraçãozinho batendo. Aquela frase me atingiu com força e imediatamente as lágrimas vieram aos meus olhos.

Não sei descrever o que senti. Foi como querer tocar uma nuvem e ao chegar perto ver que é tudo vapor. Como a criança que segurou em falso o balão e o viu subir até desaparecer no céu. Como um vento que passou e levou a carta para longe, antes que fosse lida. Como um sonho que escorreu por entre os dedos antes que pudesse se tornar realidade.

Meus olhos encontraram os dele e, como se fosse possível, tentaram se consolar mutuamente enquanto nossos sentimentos se esfolavam ladeira abaixo. Me abandonei naquele abraço desejando com todas as minhas forças acordar daquele cruel pesadelo, ofegante e aliviada na minha cama em uma madrugada qualquer. Ao invés disso, voltei para casa e chorei todas as lágrimas que pude produzir.

Sangue, sangue e mais sangue. Hospital, internação, comprimidos, medicamentos. Tento levantar, tudo preto, não consigo, volto pra cama. Minha mãe, meu pai, eu tô bem, vou ficar bem. Quis pedir desculpas mas não encontrei coragem nem motivos. Sala de cirurgia, sedação. Fim.

Três dias depois, volto ao trabalho como quem volta de uma virose. Direto para uma viagem devido a um evento importante do setor. Porque a Convenção não mudou de data só porque sofri uma perda. Assim como as pessoas não ficaram mais gentis só porque estou sofrendo. Na verdade, ninguém nem imagina que eu estou sofrendo. Ninguém nem olha direito para mim. O que, neste momento, é até bom.

O trabalho não deu uma trégua, pelo contrário, os e-mails se acumularam e tudo está atrasado. Eu quero chorar, quero deitar um pouco, quero contar para alguém. Mas não há tempo pra isso, nem alguém que se importe. E, na marra, eu sigo adiante. Porque o mundo não pára para contemplar a minha dor.

Àquela altura, já existia uma música. Uma música totalmente pronta e gravada. Eu nem imaginava. Meu marido a guardara em segredo para me presentear quando conseguíssemos escutar com clareza as batidas do coração daquele nosso bebê, o que jamais viria a acontecer.

Alguns dias depois de todo o ocorrido, ele comentou comigo que havia feito uma música para mim, mas que a guardaria para um momento futuro. Concordei. E desde então não tocamos mais no assunto. Eu guardei os poucos itens da minha curta gravidez em uma caixinha e a escondi debaixo da cama, para não olhar mais para ela. Eu achei que ele também tinha trancado a música, guardado para resgatar apenas quando toda aquela amarga lembrança tivesse passado por completo.

Mas não foi assim. Meses depois, ele me contaria que cantava e tocava com frequência a música que ele tinha feito, escondido de mim, quando eu não estava em casa, para não esquecer. E foi apenas dois anos depois, quando finalmente escutamos pela primeira vez os batimentos nítidos e acelerados do coração de nosso novo bebê, que ele me apresentou a música.

Até então, eu achava que a música tinha nascido lá atrás mas tinha mudado, passado por adaptações, e o que eu estava escutando pela primeira vez era uma versão nova, recente. E foi apenas quando ele me mostrou a gravação, que eu soube da existência de um arquivo original, datado de agosto de 2015 e salvo em suas pastas pessoais.

Foi só aí que caiu a ficha, que me dei conta de tudo. Que percebi que durante dois anos ele cultivou secretamente uma trilha sonora perdida no vazio, aguardando um enredo real que lhe servisse, a música da nossa gravidez. Que quando ele cantava que “a melhor notícia do mundo é que vou ser pai”, ele cultivava o sonho, a esperança e a certeza de que esse momento chegaria. Que a gestação dele durou dois anos, até que a minha chegasse.

A música, que já é suficientemente linda por si só, ganha um brilho ainda mais especial quando inserida em seu contexto. A você, Jader, meu amor, muito obrigada por transformar a história mais triste que já vivi em uma linda história de amor. Você tem o dom de trazer doçura mesmo às frases mais amargas da nossa vida. Eu também te amo mais.

Link da música:

Facebook:

Youtube:

https://youtu.be/4S3B1eN-g9M

Do lado de fora

Eu fico aqui, do lado de fora. Sem saber direito o que se passa aí dentro. Sem saber se está tudo bem, se você está crescendo, se seu coração está batendo como deveria. Eu fico aqui aguardando passivamente que tudo aconteça. Não posso fazer nada além de fazer nada.

Eu fico aqui, sentido as consequências. Atenta aos sintomas. Com explosões de tons de rosa e azul passando pela minha cabeça. Com tantas coisas para pensar que não sei nem no que penso primeiro. O enjoo é tanto que atrapalha meus pensamentos, só quero que essa fase inicial passe logo e leve consigo o enjoo, o risco e o medo.

Eu fico aqui, pedindo a Deus. Por você. Que você viva. Tudo o que mais desejo, com todas as minhas forças e do mais profundo de mim, é a vida. Esse milagre que é a vida, esse presente imerecido e incontrolável. O que mais quero é vê-lo viver. É sentir o seu corpinho quente nos meus braços. É ver seus olhinhos se abrirem para o mundo aqui de fora.

Eu já tenho tanto amor para te dar. Desde quando soube de você. Desde antes de saber de você. Desde quando comecei a te desejar, a pedir a Deus que me desse você. Eu já te amo com uma força incrível, mesmo você sendo tão pequenininho. Será que você já consegue sentir esse amor?

Eu fico aqui, olhando pela janela. Vendo as pessoas andando de um lado para o outro com tanta liberdade. Vendo o dia que passa até chegar a noite. Olhando para fora e para dentro. Esperando que meu corpo resolva por si só. Esperando que tudo fique bem. Esperando poder voltar a trabalhar, esperando poder voltar a sair, a caminhar, a andar despreocupadamente. Dias em que tudo o que posso fazer é esperar.

Um quentinho para o coração 


Namore alguém de que você não goste de se despedir. Alguém que traga uma sensação boa quando você pensa nele em algum horário do dia. Namore alguém que te faça sentir mais feliz, mais disposto, mais vivo. Que traga um quentinho ao seu coração.

Namore alguém que goste de conversar, que diga mais sim do que não, que vá com você e ache a sua companhia mais relevante do que o programa em si. Namore alguém que não economize sorrisos, que goste de andar de mãos dadas, alguém que você goste da pele, do toque, do tato. Alguém em que você se encaixe direitinho em um abraço.

Namore alguém que te ame, mas não espere que outra pessoa possa preencher o amor próprio que lhe falta. Ame-se o suficiente e o necessário para não ser carente demais, nem ciumento demais, nem arrogante demais. Se você já se sente muito completo sozinho, talvez tenha que tirar um pouquinho de si para abrir espaço para seu par se deixar um pouco em você.

Talvez você tenha que ter uma elasticidade em seus projetos e sonhos para comportar os projetos e sonhos de um outro alguém. Recalcular a rota quantas vezes for preciso até que os dois caminhem na mesma direção.

Lembre-se de que você é uma parte boa da vida do seu namorado ou namorada. Ajude-o a ser melhor. Incentive seu par a cultivar suas amizades, pois você não as substituirá. Agregue-as como seus novos amigos. Incentive-o a cultivar seus hobbies, pois você também não os substituirá.

Se você já encontrou este alguém, namore para casar. Não caia naquele papo de que o bom mesmo é ter vários relacionamentos, experiências diferentes, não se prender a ninguém. Bobagem. Se você já encontrou a pessoa que você quer ter sempre ao seu lado, não a perca. Mesmo que você seja muito jovem. Mesmo que seja seu primeiro namorado ou namorada. Quando você for mais velho, vai perceber como é valioso dividir a vida por tantos anos com a pessoa que se ama.

Se você é casado, continue namorando. Nunca deixe seu namoro deixar de ser namoro. Não venha com essa conversa de que essa data é puramente comercial, não pense que é só para casais jovenzinhos, não deixe o romantismo morrer. Lembra daquela sensaçãozinha que você já teve no passado de querer tanto ter alguém para passar o Dia dos Namorados? Se hoje você tem, aproveite.

Quando as últimas velas se apagam



Algumas semanas antes

Minha vovozinha que tem 100 anos foi internada semana passada. Seu organismo não está mais conseguindo engolir, fazendo com que ela tenha que se alimentar por uma sonda. Escrevendo isso aos meus familiares, li o que havia escrito e me dei conta do quanto é triste. E chorei.

Chorei porque por mais saúde que a gente tenha, o corpo tem uma data de validade, e mesmo que não haja nenhum problema, uma hora ele para de funcionar.

Chorei porque ela vai morrer, porque meus outros familiares vão morrer também um dia e porque a perspectiva da morte dói quase tanto quanto a própria morte.

Chorei porque a vida consegue ser tão ingrata, que lutamos tanto para emagrecer, até que vem um câncer e nos rouba dez quilos em um mês, ou vem a idade e nos leva a capacidade de engolir.

Chorei porque a mortalidade não nos cabe, é uma roupa apertada diante do nosso anseio pela eternidade. Porque nenhuma hora parece ser a certa para a despedida.

Porque tentamos ser tanta coisa a vida toda, queremos tanto, corremos tanto, até que chega a hora que não conseguimos mais andar, nem lembrar, nem conversar, nem ser mais nada daquilo que nos caracterizava como nós mesmos. Tudo é vaidade.

Como no Curioso Caso de Benjamin Button, a idade avançada nos faz ser como bebês recém-nascidos, totalmente dependentes, gastando a maior parte da nossa vida de olhos fechados, dormindo, perdidos em sonhos que ofuscam a nitidez do nosso curto espaço de realidade. E então vamos encolhendo, diminuindo, regredindo e perdendo a forma, até desaparecer.

O que me consola é saber que logo do outro lado está o Pai, de braços estendidos a nos receber, alegre por termos enfim chegado. E que minha avó vai poder sorrir novamente aquele sorriso alegre e cheio de vida, e vai estar repleta de força e energia para adorar ao Jesus que ela tanto anseia encontrar.

28 de abril de 2017

Chorei, porque é impossível não chorar diante da morte de quem se ama.

É triste, mas ao mesmo tempo feliz, pensar no encontro de uma pessoa com Deus. Lembro-me de tantas e tantas vezes que, sozinha com a vovó, conversávamos sobre como seria o céu. Como deve ser conseguir andar, e falar, e sorrir, e se maravilhar no paraíso, após anos de locomoção limitada e vida social restrita?

Os meses e anos se passavam e Deus prolongava a estadia dela aqui na Terra, e era tão bom poder visitá-la e sentir o calor da sua pele, passar os dedos em seus cabelos brancos, penteá-los, apoiar minha cabeça sobre seu colo e receber seu carinho.

Vovó me perguntava se eu me nunca esqueceria dela. Claro que nunca vou te esquecer, vovó. Carregarei para sempre seu nome em meu nome e sua lembrança em minhas memórias e em meu coração.

Sua história se encerra de uma forma bonita e serena. É feliz pensar em tudo o que vivemos juntas, todos os momentos que pude aproveitar ao seu lado. Descanse em paz, vovó. Nos encontraremos no céu um dia.

Ô palavra boa de falar

“Ô palavra boa de falar”, dizia minha mãe quando éramos crianças e vivíamos falando “mãe” pra cá, “mãe” pra lá. É verdade, mãe. Mesmo quando a gente cresce, essa continua sendo a palavra mais gostosa de falar.

Hoje tenho a idade que minha mãe tinha quando nasci. Eu que sempre a achei tão adulta, forte, conhecedora de tudo. Eu que achava que ela não chorava, que nela não fazia dodói, que ela podia tudo. Hoje, do alto de minhas incertezas, penso na vida de minha mãe, jovem, mãe de primeira viagem, se sentindo provavelmente tão insegura ao me pegar em seus braços.

Fui eu que vim ao mundo e mudei completamente sua vida, transformei seu contexto, virei suas certezas de cabeça para baixo. Eu que desestabilizei tudo. E mais tarde veio meio irmão para me ajudar a bagunçar. E depois minha irmã para acabar com toda a ordem de vez. Sempre achei minha mãe corajosa de ter tido três filhos, ainda acho, mas às vezes a coragem é a única opção.

Mãe é aquela palavra que desperta em nós o amor mais verdadeiro, mais instintivo, mais profundo. Quando queremos prestar alguma homenagem a nossa mãe, nos faltam palavras, parece que tudo que podemos dizer é tão clichê que não reflete este sentimento único que levamos em nosso peito.

A palavra mãe também nos traz uma dose de culpa, nos sentimos sempre em dívida, talvez por nos dedicarmos a ela menos do que gostaríamos, pois sabemos que ela merece mais de nós do que conseguimos dar.

A mãe está sempre no nosso pensamento. Acontece uma coisa boa, ou ruim, e dá logo vontade de contar para a mãe. A gente coloca uma blusa amassada e já mentaliza automaticamente o olhar reprovador da mãe. A gente viaja e pensa se a mãe gostaria ou não daquele lugar. A gente se mete em apuros e pensa na reação da mãe se ela visse a gente agora.

A gente passa uma parte da vida tentando ser independente da mãe. Mas, que bobagem, é tão bom tê-la cuidando de nós. Passamos da medida um pouco pra lá, um pouco pra cá, até chegarmos no ponto certo de saber receber o cuidado após já termos sido criados. A gente vai crescendo e cada vez vai tendo mais certeza de que não tem nada melhor do que casa de mãe, colo de mãe, abraço de mãe e cheiro de mãe.

É nela que encontramos o nosso abrigo mais primário, o nosso ninho, a acolhida certa. Sabemos que ela infelizmente não estará para sempre lá, mas em algum momento já ouvimos dela que ela será sempre nossa mãe. E nos consolamos nessa frase que é tão óbvia e ao mesmo tempo tão tranquilizadora de escutar.

O Dia das Mães não é só pra elas, é também para nós. Ele vem para nos lembrar de falar tudo isso pra ela. Para nos forçar a colocar pra fora, em palavras e abraços, aquilo que sentimos por ela. Queremos estar pertinho neste dia, mas mesmo se não for possível, queremos que ela saiba que está aqui ocupando um lugar cheio de amor no nosso coração. Te amo, mãe.

Carta a uma noiva (atenção: contém spoiler) 

Fica tranquila, você não vai chorar, não vai borrar a maquiagem. E relaxa, ele não vai chegar atrasado, nem você. Também não se preocupe com a filmagem, pois você nunca chegará a recebê-la. Ah, sim, ele será gentil esta noite. Como eu sei disso? Eu sou você daqui a 7 anos. E o mais impressionante é que, mesmo que você não saiba nada do que vai acontecer daqui pra frente, a maior parte das coisas que tenho para te contar você já sabe. Sim, é ele. Ele é o grande amor da sua vida. Você já sabe disso. Você vai amá-lo como pensa que irá amá-lo, até mais.

Ele será o seu melhor amigo, com quem você vai dividir tudo. Ele será a sua melhor companhia. Vocês vão se jogar à noite na cama e ficar papeando até tarde, vão rir juntos assistindo Porta dos Fundos, vão confidenciar sentimentos. Vão pegar muita estrada juntos, vão conversar sobre tudo, por horas e horas. Vocês vão levar a sério esse negócio de se tornar um só, a ponto de não se reconhecer mais sem o outro, pois ele já é parte de você.

Às vezes vocês vão pensar igual, vão falar juntos a mesma coisa, vão se comunicar apenas pelo olhar. Ele vai te ler com os olhos de raios X que você vai até se assustar. Não tente fingir que não chorou, não tente fingir que não comeu chocolate, ele vai saber. Quando você quiser guardar seus pensamento só pra você, você vai se retirar para o quarto, vai fechar a porta, vai talvez escrever. Ele vai entender.

Haverá dias em que você vai estar estressada, cansada, exercendo seu direito mensal à TPM, e vai querer achar um culpado, vai ser chata e não vai ter paciência com ele, afinal, quando se divide a vida com alguém não é possível disfarçar o que se é ou o que se sente. Ele também terá seus dias ruins, que às vezes coincidirão com os seus, e entre encontros e desencontros vocês vão aprendendo a dar o espaço, o silêncio e o perdão necessários para a caminhada.

Às vezes você vai ter um ataque de ciúmes, uma preocupação se você deveria ser mais ciumenta, se deveria ser daquelas esposas que ficam checando o e-mail, facebook e WhatsApp do marido, porque nunca se sabe, né. Uma vez ou outra vai até dar uma espiadinha, mas você não tem paciência pra ler nem os seus, imagina os dele. Você vai querer dar um tapa na cara da moça do caixa da padaria que fica fazendo graça pra ele na sua frente, e ele fica se sentindo a última bolacha do pacote, mas o que você pode fazer? Além disso, ela tem bigode.

Ele vai dar muita risada de você, mesmo aos 7 anos de casados. Vocês vão falar besteiras, vão ser bobos, vão fazer palhaçada. Vocês vão se divertir juntos, vão fazer várias viagens legais, vão curtir muito o tempo a sós que vocês tiverem. Você continuará fascinada pelo sorriso dele, pelo olhar dele, pela expressão carinhosa com que ele irá te olhar.

Você irá passar por situações muito difíceis, coisas que você nunca pensou que aconteceriam com você, mas não quero te falar disso agora. Só quero que você saiba que, em todos estes momentos, ele estará ao seu lado. Ele vai segurar a sua mão e te abraçar. Ele vai ser o seu porto seguro quando a sua estrutura ruir. Vai te trazer de volta para a realidade quando tudo parecer maior do que é.

Você se apaixonará e reapaixonará milhares de vezes por seus beijos, por seu toque, por sua pele. Você vai ficar secretamente olhando-o adormecer e pensando o quanto é bom tê-lo ao seu lado. Seu corpo vai ter uma conexão tão certa com o corpo dele que o jogo de texturas, gostos e ritmos vão se combinar em uma proximidade irresistível.

Ele vai te apoiar em tudo, vai te incentivar, vai acreditar em você. Na verdade ele vai te estimar até demais, vai falar coisas tão legais sobre você que você vai se perguntar de onde foi que ele tirou tudo isso, como foi que ele teve aquela leitura de você. Ele vai se preocupar com que você esteja bem e feliz. E quando você não estiver bem, ele vai fazer de tudo para te ajudar a mudar a situação, para te mostrar um novo ângulo, para te mostrar que você pode fazer diferente, mesmo que você não acredite mais.

Você continuará com a mesma insegurança sobre o amanhã, com medos que talvez nunca se concretizem, com a mais pura expectativa pela próxima página. Ele continuará vivendo linha por linha, parágrafo por parágrafo, deixando o amanhã para o dia seguinte, como deve ser. Vocês vão acabar se complementando, cruzando as narrativas e construindo juntos uma linda história.

Por fim, queria agradecer a você, por ter tanta certeza, por estar tão determinada e disposta a fazer dar certo. Essa noite você vai dizer Sim. Você terá muitas decisões importantes para tomar pela frente, mas essa sem dúvida será a melhor de todas.
Daqui a alguns anos, haverá momentos em que não vai restar mais nada, não vai haver ninguém e você vai se sentir esgotada e sem forças. Então, no escuro, baixinho, é ele quem você vai escutar dizendo “eu te amo”.