A mente de uma mulher (ou pelo menos o que se passa na minha)

Sou mulher. Quero dar conta de tudo, quero ser boa no que faço. Quero saber cozinhar bem, quero manter minha casa sempre em ordem, roupas limpas e passadas. Quero ser uma boa esposa, compreender as necessidades do meu marido, fornecer a ele um lar acolhedor onde ele encontre respeito e amor, um lugar aonde ele tenha prazer em retornar ao final do dia e me encontrar.

Quero ser uma boa amiga, estar presente, participar das conquistas, abraçar nos momentos difíceis, estender a mão e oferecer o ombro. Quero ser uma boa filha, uma boa irmã, dar amor, palavras de apoio e conselhos. Quero ser mãe, uma boa mãe, ter tempo para dedicar ao meu filho, acertar na educação e nos limites.

Quero ter um tempo para mim, para me cuidar, ter corpo e mente saudáveis. Quero estar sempre com as unhas feitas, raiz retocada, cabelo hidratado e depilação em dia. Quero me alimentar bem, fazer exercícios, estar sempre disposta e animada. Quero ter energia para realizar tudo o que preciso fazer.

Quero ter realização na minha vida profissional, quero me desenvolver, liderar, influenciar, transformar minha empresa e meu ambiente de trabalho. Quero ver as coisas sendo feitas com mais eficiência e foco. Quero alcançar bons resultados, quero superar os resultados, quero reconhecimento por isso.

Quero que as pessoas tenham uma boa impressão de mim, quero causar um impacto positivo, quero ter coisas inteligentes a dizer. Quero fazer algo relevante, quero ter significado, deixar um legado, ter sentido. Quero conhecer o mundo, ter experiências diferentes, vivenciar novas culturas.

Quero ter um hobby, algo que eu goste de fazer e possa passar meu tempo livre. Quero ter mais tempo livre para dedicar ao meu hobby. Quero um dia sem programações, que eu possa apenas sentar no sofá e relaxar. Quero ir ao teatro, quero ir ao cinema, quero acompanhar uma série pelo netflix. Quero ir a um show, a um musical, quero caminhar no parque, sentar na sombra e ler um livro. Quero ler vários livros. Quero um dia escrever um livro.

Preciso manter meus exames em dia, preciso estar atenta ao meu ciclo menstrual, preciso estar atenta aos produtos que faltam em casa. Talvez deva considerar os orgânicos, talvez deva substituir os potes de plástico por vidro, talvez deva considerar uma luta de defesa pessoal, talvez deva considerar meditação.

Gostaria de ser mais simples, menos materialista, ajudar mais ao próximo. Gostaria de ser mais desencanada, menos ansiosa, menos preocupada. Gostaria de desenvolver mais minha vida social, minha vida espiritual, meu relacionamento com Deus.

Quando olho para a lista de tudo o que quero e preciso ser, me sinto frustrada sabendo que não conseguirei ser tudo. Sei que algumas coisas vão acabar passando, talvez uns quilos a mais, talvez um gap na carreira, talvez uma falta em casa.

Às vezes tenho vontade de chorar sem um motivo específico, sem entender direito porque estou chorando, mas sem conseguir conter. Às vezes penso que há pouca vida para tantos sonhos, às vezes penso que há poucas forças para tanta vida.

Tem noites que não durmo bem, que acordo cansada, com vontade de dormir mais um pouco. Mas tenho que acordar, tenho que me arrumar, dirigir até o trabalho e ter a garra necessária para enfrentar os desafios diários. Ao final do dia, só quero chegar em casa e ter tudo pronto, mas nada nunca está pronto sem que eu faça.

Sinto que tenho a responsabilidade de mostrar que sou forte, que não é por ser mulher que sou mais fraca do que outros. Mas às vezes não sou forte, às vezes não quero ser forte, às vezes quero ter quem faça por mim, quem lute por mim, para me poupar.

Não quero ser feminista, mas também não quero ser machista, e me pergunto se há a causa da vida normal para que eu possa defender, ou se existe alguma vida normal que envolve a existência de papéis diferentes sem níveis de privilégios.

Às vezes olho para algumas mulheres e me pergunto como elas conseguem ser lindas, saradas, alegres, dispostas, com uma família pra cuidar, um trabalho para desempenhar e tudo o mais. Mas, que ingenuidade, sei que toda mulher tem dentro de si uma luta que é só sua, um dilema que é só seu e que ninguém vê, mas às vezes me esqueço disso e apenas invejo, ou julgo.

Admiro as mulheres, e me impressiono como sempre encontro algum ponto em que nos identificamos, por mais diferentes que sejamos. Sei que um universo inteiro acontece dentro das nossas mentes, uma explosão de emoções está sempre viva em nosso peito. Amo ser mulher.

A você, mulher, desejo coragem sempre, persistência para lutar pelos seus sonhos. Que quando você se sentir pequena, você possa ser grande na vida de alguém. Quando se sentir insegura, encontre alguém em quem possa firmar suas bases e prosseguir. Que você encontre o sentido que procura, a relevância que procura, o conforto do pertencimento. E principalmente, que você viva, transborde, alimente, transmita e doe o amor, pois será isso que fará de você uma grande mulher.

Cadeira vazia

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A separação acontece. Alguém que se muda para um outro país, outra cidade, outra empresa. Ou para uma realidade incompatível com a sua. Alguém com quem você passou uma vida inteira, ou algum romance curto, mas intenso. Ou uma amizade rara. Às vezes o fim é conhecido, esperado ou necessário, o que não quer dizer que é sem dor.

Incrível como coisas pequenas nos despertam a memória. Uma lembrança vem junto com um filme, uma música, um perfume. O vento frio de noite, um percurso, um lugar. Aquela vontade de comentar algo que um dia teria feito sentido, mas hoje não mais.

Difícil olhar para a cadeira vazia, para os objetos que ficaram, para as fotos antigas. Reviver na mente os momentos vividos traz uma sensação estranha, difícil de distinguir se boa ou ruim na paleta de tantos tons em que as emoções se apresentam. As cenas desfocadas, as falas reescritas, um gosto doce meio amargo. Dá uma dorzinha no peito e os olhos ardem ao contemplar aquela saudade que nunca se apaga totalmente, uma brasa adormecida que, se cutucarmos, começa a queimar de novo. Às vezes é mais seguro evitar.

Fica uma ausência que não tem solução, e não porque a pessoa morreu, mas porque mudou. Ou, sejamos honestos, os dois mudaram, cresceram, seguiram setas opostas em tantas bifurcações que foram parar em universos completamente diferentes, a ponto de não haver mais nada em comum além da própria nostalgia.

Fica um carinho mútuo, um respeito pelo que se viveu, um espaço vitalício no coração, um amor congelado no passado.

Fica a dúvida de como foi que aconteceu, se foi por não ter ancorado a corda, por ter deixado à deriva até se perder. Ou por ter se afastado sem saber bem ao certo se por prudência ou covardia. Fica o desconforto do que poderia ter sido e o vazio do que faltou ser. E que não volta mais.

Não faça dívidas com o amor. Mantenha-o em dia. Demonstre. Confesse. E então a saudade só irá te mostrar o quanto valeu a pena.